9.6.10

Dicionário Tonga

Moro em Mazabuka (provincia que fica no sul de Zâmbia). O idioma mais utilizado nesta região é o Tonga, esta é uma das 7 maiores tribos daqui.
Estou aproveitando este período aqui para aprender a lingua local. Antes de vir para cá, sentia muito mais dificuldade para entender e estudar outras linguas. Mas vejo que nos fazemos parte de uma raça de poliglotas. Acredito que todas as pessoas a partir de 7 anos já sabem pelo menos a lingua local e o ingles. A Kaka, minha vizinha de 9 anos, sabe falar fluentemente Ingles, Tonga, Bemba, Nyanja e ainda esta aprendendo a lingua dos sinais.
Entao resolvi fazer o meu dicionario de Tonga, hoje eu vou postar algumas palavras.

Se por um acaso você vier no Sul de Zâmbia ou no Norte do Zimbabwe você pode usar este idioma.

Tonga ...............O som da palavra .................. Português
1.Boola kuno ...............Boola Kuno ...........................Vem cá
2.Daunka ...................Ndaunka .................Eu estou indo -thau
3.Dunka ku… .............Du-un-ka gu… ............Eu estou indo para…
4.Dyunka Ku… ...........Eu estou indo para… .............Diun-ka gu…
5.Izina lyangu ndime… ..Izina liangu dime… ..............Meu nome é…
6.Kwasya buti? - Kaboto ..Guaxiabuti? Res.:Gaboto .Boa noite - Boa noite
7.Mebo .....................Mêbo .................................Eu
8.Mwabuka buti? - Kaboto .Muabuga buti? Res.: Gaboto ..Bom dia - Bom dia
9.Mwalibizya buti? Kaboto ..Mualibiabuti? R.Gaboto.Boa tarde Boa Tarde
10.Nchicangu ...............Tijanngo ........................Isso é meu
11.Nda myaka ili 24 ........Nda mianga iri 24 .......Eu tenho 24 anos
12.Ndiyanda kunyua .....Ndianda gunua .............Eu quero beber....
13.Ndiyanda Kuulya… ...Ndiãnda guriá… ...............Eu quero comer…
14.Ndizwa ku Brazil ........Ndizua ku Brazil ............Eu sou do Brasil
15.Nduweni?................ Du-ê-ni? ..................Qual é o seu nome?
16.Ng’anda .................Nhanda ................................Casa
17.Sapato ..................Sapato ................................Sapato
18.Twalumba...........Toalumba ............................Obrigad@
19.Twalumba Kapati........Toalumba Gapati ............Muito Obrigada
20.Twalumba Kubonana .......Toalumba Kubonana .........Prazer em conhecer
21.Twaunka ..........Toaunka .............Estamos indo - Thau
22.Uli kuli Julio? .........Ori guri Julio? ...........Onde esta o Julio?
23.Muzungu ........... Muzungu .................Branco
24.Chibotu .......... Gibotu ............. Bom

3.6.10

Poligamia em Zambia


A poligamia em Zambia é mais praticada nas areas rurais e principalmente entre os Tongas, grupo que ocupa a parte sul do país, justamente onde nós estamos. Esse assunto, mesmo aqui, gera muita polemica e defensores e não defensores desse sistema tem suas teses pró e contra. O que preconceituosamente a gente costuma pensar é que é um sistema um tanto quanto promiscuo onde basta o homem ter vontade que ele faz um harem em casa, mas não é bem assim, o sistema é cheio de regras, uma delas e pra mim a principal é a necessidade do consentimento da primeira esposa para que o homem case com a segunda, se a primeira mulher não quiser ,não tem jeito, o homem não pode casar com mais ninguem, e mesmo no caso da segunda esposa ser aceita, esta deve se submeter a primeira que é autoridade maxima dentro de casa.
Uns(cristãos) dizem que a familia é composta por um marido e uma esposa, com os seus respectivos filhos, mas tem gente que diz que esse sistema inibe o divórcio e a possibilidade de traição, já que ,segundo essa teoria, se um homem já casado estiver interessado em outra mulher, é melhor ele casar com ela do que mante-la como amante. A questão que me veio a cabeça foi: e se for a mulher que estiver interessada em algum outro homem que não o seu marido? Um certo dia , me fazendo de inocente, fiz essa pergunta por aqui, “e se a mulher quiser casar com mais de um homem?” , a maioria das pessoas(homens e mulheres) disseram que isso era um “absurdo”, “impensável”, até que um jovem me veio com a seguinte pérola: “não pode, porque é o homem que casa com a mulher e não a mulher com o homem”, falei pra ele que no Brasil os dois se casavam entre si,e a ordem dos fatores realmente não alterava o produto, mas pensando bem, isso até que faz um certo sentido, aqui em zambia (quase sempre) é o homem que escolhe a mulher pra casar, e não o contrario, contudo isso não quer dizer que a mulher é obrigada a aceitar, outro fator importante é o dote* , que é sempre pago pela família do homem, cheguei a conclusão que aqui pode se dizer que é o homem que casa com a mulher, mas não acho que isso por si só justifica o fato do homem poder casar com mais de uma mulher e a mulher só ter um homem, não to aqui pra criticar a cultura de ninguem, mas não sei se eu fosse mulher se acharia isso engraçado(o que vcs acham?). Pra terminar, esse cara que ta do meu lado(a direita) na foto é o chefe da comunidade Nkonkola, tem 3 esposas e 24 filhos, um sorriso no rosto e muita história boa pra contar, só não tive coragem pra perguntar nada sobre poligamia, o cara era o chefe,se ele ficasse com raiva de mim...

*O dote é outro assunto, para as pessoas sérias, o pagamento feito à familia da noiva, não é nada mais do que um pedido de agradecimento feito pela família do noivo, algo do tipo: "estamos pagando esse dote pelo fato de voces permitirem sua adorável filha de casar com o nosso filho". Muito bonito , mas tem uns vacilões aqui que usam essa situação para maltratarem suas esposas dizendo coisas do tipo:"me respeita e cala a boca por que eu paguei por voce", essa é uma questão que merece um aprofundamento, vou pesquisar mais sobre o assunto e escreverei em breve.

9.3.10

Dia Internacional da Mulher

Hoje eu não estava muito afim de levantar cedo. Porem havia me comprometido em tirar fotos junto com o meu projeto TCE (Total Control of the Epidemic), por conta do dia internacional da mulher. Aqui em Zâmbia e feriado nacional. Eu imaginava que seria apenas um evento organizado pelo TCE, por isso fui com um pouco de ma vontade.
Estávamos atrasadas fomos na carroça do carro com o Jabez (líder do projeto). Não precisou ir muito a frente pois a passeata já estava perto de nos.
Descemos do carro e entramos na passeata como o ultimo grupo, diferente do que eu imaginava aquele não era um evento organizado pelo TCE, haviam outros grupos de mulheres nesta passeata. Ao ver aquela quantidade de mulher na rua fiquei me questionando se este evento precisa de algum organizador ou se independente de qualquer coisa ele iria acontecer.

Enfim, não sei ainda explicar como essa reunião acontece. O que eu sei e que, tudo o que eu tive que passar para chegar aqui valeu a pena. A minha cabeça estava a mil. Vendo centenas de mulheres com roupas tradicionais, cantando, marchando e comemorando o dia que e seu. Fiquei muito emocionada, acompanhada de um arrepio que nunca senti antes e consequentemente do choro que tentei e consegui controlar somente por alguns minutos. Foi ai que pude ver a solidariedade e a noção de irmandade que as mulheres africana possuem entre elas, digo, entre nos. Uma mulher linda veio ate mim e disse: “My sister don`t cry, because today is our”(minha irmã não chore, porque esse dia e nosso). Eu disse que ia para de chorar e ela voltou para a passeata dançando e com o mesmo sorriso e felicidade que veio ate mim. Mas naquele momento não tive tempo de fazer muitas reflexões sobre isso. Mas rapidamente o que pude pensar e que esta mulher não me vê como pertencente de sua tribo ( Tonga) porque não falou comigo na sua língua local e sim em inglês. Porem o sentido de irmandade em África não se restringe a tribo e sim a toda comunidade de mulheres negras. Fiquei na duvida se ela sabia ou não que eu não era Zambiana, enfim. O que importa que ela estava certa, eu deveria aproveitar o meu dia.
Resolvi não perder mais nem um minuto. Me deu uma vontade louca de correr. Como sou livre e aqui me sinto desta forma, CORRI. Desci o restante da rua rindo e correndo com minha maquina fotográfica na mão. Tinha uma outra mulher com uma maquina muito mais poderosa que minha, era uma mulher loira que ao me ver correndo, conscidência ou não resolveu fazer o mesmo.
Pude perceber que por onde eu passava as mulheres na passeata acenavam para mim. Parei, e comecei a fotografa-las. Mas não acontecia o mesmo com a outra fotografa. O que fez com que ela ficasse na aba dos acenos e sorrisos que eram para mim. Fiquei ainda mais orgulhosa das mulheres Zambianas.
Nesta passeata todas as mulheres tinham o seu grupo com a mesma estampa de pano. Tinha o grupo das enfermeiras e medicas, policiais, ministras e suas secretarias, das mães com seus filhos nas costas, das vendedoras ambulantes com seus produtos a venda na cabeça. Nem um grupo foi esquecido.
O papel dos homens nesta festa e bem definido, seu papel e carregar as faixas, organizar o transito, fazer declarações de reconhecimento do papel da mulher na comunidade zambiana e dançar para nos ou bater palmas ao nos ver passar.
A passeata terminou em um campo enorme, onde já havia uma estrutura montada para dar continuidade a festa.
As apresentações começaram com grupo de mulheres dançando uma das mais tradicionais danças daqui. O que havia de mais interessante em todas as apresentações era que a interação do publico tornava as apresentações perfeitas , quando um grupo entrava para dancar, qualquer outra pessoa podia entrar também, desde que estivesse com um pano tradicional enrolado na cintura. Todos os grupos tiveram a participação de outras pessoas, que quando estas estavam na roda eram recebidos por gritos das outras que estavam do lado de fora. Quando a apresentação era boa as pessoas dançavam na roda, porem quando a apresentação era muito boa, as pessoas dançavam e davam dinheiro, e nessa hora a plateia ia a loucura.
Continuei a tirar minhas fotos e ficar felicíssima por me sentir pela primeira vez prestigiada pelo dia internacional da mulher.
O dia começou e terminou perfeito, sem chuvas e com o por do sol maravilhoso que pude ver da varanda de casa.

Ana Carolina Gomes

“- Muzungu, muzungu…”


09/03/10.


Ainda estou muito pensativa por tudo que aconteceu ontem. No entanto acabei esquecendo de falar sobre o que meus vizinhos fizeram ontem. Ainda não comentei sobre isso, mas agora em nossa casa somos 3 voluntários. Esses dias chegou um outro voluntário da Argentina, branco e que gosta de exaltar as suas origens italianas. As crianças o acham muito estranho. Pelo fato de ter muito pelo no corpo e ter os olhos de outra cor. Uma das crianças, a Kaka de 9 anos, acha o nariz dele horrível e morre de rir falando mal do nariz dele (que é pequeno e fino). Graças a Deus ela fala isso perto de mim, porque quando ela fala do nariz dele, ele sempre diz: “ - Meu nariz é perfeito”. Ela sempre fala: - Não é nada, perfeito e o meu e o da Ana. Enfim…


Ontem a tarde estava muito cansada da festa do dia Internacional da Mulher, resolvi dormir um pouco a tarde. Algum tempo depois o Júlio bateu na janela do quarto falando para eu ir ver o que as crianças menores haviam aprontado. Ele estava com o Lemi no colo, com o rosto pintado de branco. Eu fiquei arrasada, e o Júlio achando a maior graça e ainda me perguntando porque eu estava tão séria.


Foi quando o Lemi fez: -Buuuuuuuuu! (esta criança que aparece na foto)


E ai eu percebi que na verdade ele não se pintou de branco, ele era apenas uma criança negra, brincando de ser uma assombração.


Me deu ate um alivio tão grande no peito.


..............


As crianças africanas são muito engraçadas. Nós temos relatos de uma voluntária, que quando ela ia para as zonas rurais as crianças corriam desesperadas dela gritando para as outras crianças: “- Muzungu, muzungu…” (significa branco em Nyanja). E se escondiam, outras choravam e não iam para fora de casa de jeito nenhum. Olha que isso aconteceu com uma baiana do cabelo cacheado. Ela falava que se sentia muito mal, pois era vista quase como um bicho.


Eu achei isso tudo de bom. Infelizmente eu não estava perto para ver esta cena com os meus próprios olhos, mas valeu a pena ouvir a história.